terça-feira, 10 de abril de 2012

CAO/Infancia e Juventude/MPMG - Nota de repúdio à decisão do STJ - estupro - relatividade da presunção de violência

Há alguns dias, reproduzimos neste blog a notícia do site do STJ e uma posterior nota de esclarecimento, acerca da decisão que considerou relativa a presunção de violência em crime de estupro de pessoa vulnerável (no caso concreto, menor de 14 anos). Ainda no que se refere à polêmica decisão, o Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça da Infância e Juventude do Estado de Minas Gerais, discordando da posição adotada pelo STJ, publicou a seguinte nota de repúdio.






Nota de Repúdio




Assunto: Decisão do Superior Tribunal de Justiça que considerou como relativa a presunção de violência ocorrida em estupro de menores de 14 anos.
Belo Horizonte, 03 de Abril de 2012.

O Centro de Apoio Operacional às Promotorias de Justiça da Infância e Juventude do Estado de Minas Gerais – CAO/IJ vem pelo presente repudiar a decisão do Superior Tribunal de Justiça (STJ) publicada na semana passada, que absolveu o autor do estupro de três meninas, ante o argumento de que as vítimas já tinham experiência sexual.

Conforme se extrai da decisão, o réu deixou de ser condenado porque se entendeu que não houve violação ao bem jurídico tutelado, in casu, a liberdade sexual, tendo em vista que as adolescentes já se prostituíam na época dos acontecimentos.

Mesmo que o julgado tenha tomado como fundamento o antigo art. 224, alínea “a” do Código Penal, já alterado, que estabelecia a presunção de violência quando se tratava de vítima menor de 14 anos , em razão do fato de sua impossibilidade de consentir validamente por conta de se seu desenvolvimento psíquico incompleto, não há razão plausível para se considerar como relativa a presunção de violência ocorrida, muito menos levar em conta o consentimento ou a conduta da vítima menor para se elidir a tipificação do crime de estupro.

Ainda que constatada a prostituição das adolescentes, tal fato não pode ser interpretado como exclusão da tipicidade da conduta repugnante do réu.

Crianças e Adolescentes são seres em desenvolvimento, cujo psiquismo e corpo estão em formação, devendo ser protegidos de qualquer forma de negligência, maus tratos, exploração, violência, crueldade e opressão. Como meninas com idades por volta dos doze anos, não se pode considerar que, juridicamente, possuíssem capacidade cognitiva e emocional, muito menos maturidade sexual suficiente para se ter discernimento da gravidade dos atos que vinham praticando, o que invalida o consentimento dado para a prática do ato sexual, tendo em vista a sua vulnerabilidade.

E por tais razões, não é admissível que uma Corte Superior não tenha considerado em seu julgamento a condição peculiar das adolescentes como pessoas em desenvolvimento, que por si só já justifica a presunção absoluta de violência no caso em questão.

Considerando que as vítimas são adolescentes de tenra idade, é imprescindível a compatibilização das normas do Código Penal com os princípios e normas de proteção dos direitos da criança e do adolescente.

A decisão prolatada não só desrespeita os direitos fundamentais dos adolescentes, como as responsabiliza pela conduta que tinham, como se culpadas e livres fossem, desprezando a completa situação de vulnerabilidade na qual viviam, como tantas outras crianças e adolescentes deste País.

Se do homem médio espera-se uma conduta razoável, ponderada, mediana, que sirva de parâmetro para a conduta em geral dos homens, muito mais se espera de um Tribunal Superior, cujos atos abrem precedentes para os Tribunais em todo o País e influenciam o comportamento das pessoas.

Dessa forma, este Centro de Apoio entende como descabida e desarrazoada a decisão do Superior Tribunal de Justiça, sendo um verdadeiro acinte aos princípios e normas legais de proteção da infância e da adolescência, que não só coloca em risco o direito de crianças e adolescentes a um desenvolvimento sadio e harmonioso, livre de violência e opressão, como também estimula a exploração e o abuso sexual de infantes, tendo em vista a impunidade estabelecida.



Andrea Mismotto Carelli
Promotora de Justiça



Coordenadora do CAO-IJ


Fonte: Assessoria de Imprensa do Ministério Público de Minas Gerais

Nenhum comentário:

Postar um comentário